quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

SÓCRATES


Lembremos a figura de Sócrates. Viveu em Atenas no século V a.C. Dizem que era um homem feio, mas, quando falava, era dono de um estranho fascínio. Procurado por jovens, passava horas discutindo na praça pública. Interpelava os transeuntes, dizendo-se ignorante, e fazia perguntas aos que julgavam entender determinado assunto. Colocava o interlocutor em tal situação, que não havia saída senão reconhecer a própria ignorância. Com isso Sócrates conseguiu rancorosos inimigos. Mas também alguns discípulos. O interessante é que a segunda parte do seu método, que se seguia à destruição da ilusão do conhecimento, nem sempre levava de fato a uma conclusão efetiva. Sabemos disso não pelo próprio Sócrates, que nunca escreveu, mas por seus discípulos, sobretudo Platão e Xenofonte.
Afinal, acusado de corromper a mocidade e ser ímpio para com os deuses da cidades, Sócrates foi condenado à morte. A história da sua condenação, defesa e morte é contada no diálogo de Platão Apologia de Sócrates. As discussões havidas durante sua prisão são relatadas no Fédon, também de Platão, e versam sobre a imortalidade da alma.
A partir do que foi relatado, podemos fazer algumas observações:

  • Sócrates não está em seu "gabinete" contemplando o "próprio umbigo", mas está na praça pública.
  • A relação que ele estabelece com as pessoas não é puramente  intelectual, nem alheia às emoções.
  • O seu conhecimento não é livresco, mas vivo e em processo de se fazer; o conteúdo é a experiência cotidiana.
  • Guia-se pelo princípio de que nada sabe e, desta perplexidade primeira, inicia a interrogação e o questionamento do que é familiar.
  • Ao criticar o saber dogmático, não quer dizer que ele próprio é detentor de um saber. Desperta as consciências adormecidas, mas ele não é um "farol" que ilumina; o caminho novo deve ser construído pela discussão, que é intersubjetiva, e pela busca criativa das soluções.
  • Portanto, ele é "subversivo" porque "desnorteia", perturba a "ordem" do conhecer e do fazer e, portanto, deve morrer.
Se fizermos um paralelo entre Sócrates e a própria filosofia, chegaremos a idêntica conclusão: o lugar da filosofia é na praça pública, daí a sua vocação política. Por ser alteradora da ordem, é perturbadora, é incômoda e é sempre "expulsa da cidade": as pessoas se riem do filósofo, consideram-no "inútil". Por via das dúvidas, o amordaçam. Cortam o "mal" pela raiz: até retiram a filosofia dos cursos secundários... Mas há outras formas de "matar" a filosofia, como quando a tornamos pensamento dogmático e discurso do poder, ou ainda, quando cinicamente reabilitamos Sócrates morto, já que então se tornou inofensivo.


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